É PERMITIDO REPREENDER OS OUTROS ?
19 – Ninguém sendo perfeito, não se segue que ninguém tem o direito de repreender o próximo?
Certamente
que não, pois cada um de vós deve trabalhar para o progresso de todos, e
sobretudo dos que estão sob a vossa tutela. Mas isso é também uma razão
para o fazerdes com moderação, com uma intenção útil, e não como
geralmente se faz, pelo prazer de denegrir. Neste último caso, a censura
é uma maldade; no primeiro, é um dever que a caridade manda cumprir com
todas as cautelas possíveis; e ainda assim, a censura que se faz a
outro deve ser endereçada também a nós mesmos, para vermos se não a
merecemos.
20
– Será repreensível observar as imperfeições dos outros, quando disso
não possa resultar nenhum benefício para eles, e mesmo que não as
divulguemos?
Tudo
depende da intenção. Certamente que não é proibido ver o mal, quando o
mal existe. Seria mesmo inconveniente ver-se por toda a parte somente o
bem: essa ilusão prejudicaria o progresso. O erro está em fazer essa
observação em prejuízo do próximo, desacreditando-o sem necessidade na
opinião pública. Seria ainda repreensível fazê-la com um sentimento de
malevolência, e de satisfação por encontrar os outros em falta. Mas
dá-se inteiramente o contrário, quanto, lançando um véu sobre o mal,
para ocultá-lo do público, limitamo-nos a observá-lo para proveito
pessoal, ou seja, para estudá-lo e evitar aquilo que censuramos nos
outros. Essa observação, aliás, não é útil ao moralista? Como
descreveria ele as extravagâncias humanas, se não estudasse os seus
exemplos?
21 – Há casos em que seja útil descobrir o mal alheio?
Esta
questão é muito delicada, e precisamos recorrer à caridade bem
compreendida. Se as imperfeições de uma pessoa só prejudicam a ela
mesma, não há jamais utilidade em divulgá-las. Mas se elas podem
prejudicar a outros, é necessário preferir o interesse do maior número
ao de um só. Conforme as circunstâncias, desmascarar a hipocrisia e a
mentira pode ser um dever, pois é melhor que um homem caia, do que
muitos serem enganados e se tornarem suas vítimas. Em semelhante caso, é
necessário balancear as vantagens e os inconvenientes.
SÃO LUIS
Paris, 1860
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